domingo, 13 de abril de 2008

Fuentes periodísticas

Se você leitor tem mais de 50 anos, então façamos um exercício de memória: onde estava e o que fazia no ano de 1968?

Eu não era nascido, e não tenho a menor idéia sobre você, mas Carlos Fuentes se lembra direitinho, e escreve sobre si mesmo na terceira pessoa em seu site oficial:

"Vive en Londres y París. Aprovecha los recursos del British Museum para iniciar la redacción de Terra Nostra. Colabora con François Reichenbach en el film México, México. Es un año crucial. Está presente en la fase final de la rebelión estudiantil parisina y publica París: La revolución de mayo. Protesta contra la invasión soviética de Checoslovaquia y viaja a Praga con Julio Cortázar y Gabriel García Márquez para apoyar a los escritores y artistas independientes de ese país. Los recibe Milan Kundera. La masacre de estudiantes ordenada por el presidente Gustavo Díaz Ordaz el 2 de octubre en Tlatelolco a fin de celebrar un Olimpiada pacífica le hiere profundamente y decide regresar a México."

O ano de 1968 foi definitivamente agitado. Três grandes acontecimentos se tornaram páginas importantes dos livros de história. Os meses de abril em Praga, de maio em Paris e de outubro no México são contados no calor do momento, através de artigos inalterados da época, pelos vinte anos de idade do escritor mexicano Carlos Fuentes em seu livro Em 68: Paris, Praga e México, da editora Rocco, lançado aqui no Brasil há cerca de duas semanas.

Admirador de Franklin Roosevelt e de sua capacidade de resolver conflitos através de meios democráticos, Carlos Fuentes é um diplomata de berço. Exerceu a função política apenas duas vezes, mas seu pai foi embaixador do México em diversos paises, oferecendo a oportunidade para o ainda jovem Carlos Fuentes conhecer outras realidades.

Nos textos, o autor não somente narra fatos a partir da perspectiva histórica, mas deixa transparecer sua opinião sobre os acontecimentos que narra praticamente “ao vivo”. Em especial sobre o ocorrido no México, país onde Fuentes criou uma identidade muito grande e uma proximidade com a política, e cunhou a metáfora “derrotas pírricas”. Explica-se: uma “vitória pírrica” significa que uma batalha foi vencida a muito custo, mas não necessariamente a guerra. Já uma “derrota pírrica”, é quando uma batalha é perdida, mas seus ideais perduram, constituindo uma vitória acima de uma derrota.

Explica-se novamente: para Fuentes, o massacre dos cerca de 400 estudantes no México em 1968 pelo regime ditatorial não foi em vão, pois o fato serviu de estopim para o fortalecimento dos partidos socialistas ocidentais e para o estabelecimento da democracia mexicana. Carlos Fuentes acredita, no fim das contas, que há males que vem para o bem.

Para um fã declarado dos presidentes democratas norte-americanos, escrever sobre massacres totalitaristas é uma proposta no mínimo sedutora, ainda mais no esplendor de sua juventude. Entretanto, participar destes episódios, ao lado de personalidades internacionais, como o colombiano Gabriel García Márquez, o argentino Júlio Cortázar e o tcheco Milan Kundera agrega ainda mais valor documental para seus textos.

O segredo do livro, certamente está nas fontes utilizadas. Além de o próprio Fuentes ter presenciado os episódios de Paris e de Tlatelolco, ele tem a ajuda de seus notáveis colegas, já citados anteriormente, no relato dos massacres. É a clara evidência de um trabalho jornalístico, considerando que o poder e a credibilidade das fontes elevam o valor simbólico de uma reportagem. Não é um texto imparcial, mas sim muito opinativo. Prova de que latinidade e sangue de barata não combinam.

O livro foi originalmente lançado em 2005 na Espanha, mas sua chegada recente ao Brasil vem mesmo a calhar, considerando que em menos de um mês, se completarão quarenta anos da data original de quando os ensaios foram produzidos. Carlos Fuentes Macías nasceu em 1928 na Cidade do Panamá, mas se considera mexicano. Escreveu mais de 20 livros e é considerado um dos maiores novelistas do mundo latino, sempre ligado à política ou a temas políticos. Vencedor de diversos prêmios internacionais como o “Miguel de Cervantes”, em 1987 e o “Príncipe das Astúrias”, em 1994, é professor titular em Harvard em Cambridge.

Vale a pena conferir seu livro, que tem tradução de Ebréia de Castro Alves e foi lançado pela editora Rocco (tel. 0/xx/ 21/ 3525-2000), com 160 páginas e o preço de R$ 25.

Um comentário:

José Renato Ambrosio disse...

Uau, ficou muito grande, até em excesso, mas só agora percebi minha empolgação. Peço desculpas!

 
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